CrônicasEM DISPUTA

Torcidas organizadas de futebol e território

Por Felipe Tavares Paes Lopes

Nesta coluna, busco, de forma muito breve, mostrar como a lógica das torcidas organizadas de futebol está vinculada à questão da territorialidade. Para tanto, começo observando que a ocupação de espaço é a essência do próprio jogo de futebol. Trata-se de levar a bola de um lugar a outro. De conduzi-la até as redes adversárias. Os vínculos entre futebol e território, todavia, não se dão apenas dentro do campo de jogo. Tanto é que as torcidas adversárias são separadas, há décadas, por grades, a fim de impedir que uma “invada” o espaço destinado à outra. A preocupação com a ocupação territorial não apenas fraciona os estádios, mas define toda a organização do espetáculo futebolístico. A torcida visitante, por exemplo, chega escoltada pelas forças policiais. Afinal, a sua chegada é vista como uma “invasão”, por um “exército inimigo”. Um grafite na entrada do portão dos visitantes do estádio do Vasco da Gama, do Rio de Janeiro, é reveladora. Diz ele: “São Januário: território hostil desde 1927”.  

As relações entre torcidas de futebol e território, todavia, não se esgotam nos estádios e arredores. Há toda uma geografia invisível da cidade que só é conhecida por quem vive o dia-a-dia das organizadas. Há territórios proibidos e territórios seguros para cada torcida. Desde os anos 1980, a geografia invisível das organizadas tornou-se ainda mais complexa. Afinal, foi nesse período que elas começaram a se espalhar pelas cidades. Hoje em dia, a maior parte delas possui subsedes e pontos de encontro em diversos bairros, o que aumenta a possibilidade de conflitos. Na geografia invisível das torcidas organizadas, há também uma série de territórios em disputa. Por exemplo, em 2012, houve uma grande briga na Avenida Inajar de Souza, na zona norte de São Paulo, entre torcedores organizados do Corinthians e do Palmeiras. Nesta, dois palmeirenses foram assassinados. Desde então, essa avenida tem sido disputada pelas organizadas de ambos os clubes.

Mas por que a questão territorial é tão importante para as torcidas organizadas? Porque elas reproduzem, de certa forma, a lógica guerreira do futebol. O futebol é guerra simbólica. Guerra sem tiros, diria George Orwell. E essa guerra reflete-se nas disputas dos torcedores nas arquibancadas e, também, fora delas. Evidentemente que, às vezes, essa guerra extrapola o plano simbólico, produzindo graves ferimentos e mortes. Mas isso já é assunto para outra coluna.

Felipe Tavares Paes Lopes é docente do Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Cultura da Universidade de Sorocaba – UNISO