OLIMPÍADA & CAIPIRA

Cinco sugestões para acabar com a invisibilidade dos Jogos Abertos do Interior

Enquanto escrevia estas linhas na noite de 6 de outubro de 2022, milhares de atletas paulistas estavam em São Sebastião, no litoral paulista, aproveitando a Cerimônia de Abertura dos Jogos Abertos ou se preparando para suas competições no maior evento poliesportivo da América Latina. Você sabia disso? Não se sinta mal: quase ninguém ficou sabendo que a 84ª edição dos Jogos Abertos do Interior ‘Horácio Baby Barioni’ estão acontecendo na primeira semana de outubro.

Quem tiver interesse e der um google, vai encontrar algumas notícias regionais de cidades paulistas, a maioria vinculada a prefeituras, e o site oficial, mantido pelo município de São Sebastião. Nele, o torcedor encontra opções de hotéis e restaurantes, informações da programação, uma carta de boas vindas do prefeito e relatos dos atletas locais. Mas nada de resultados e tampouco histórias sobre demais atletas, curiosidades e destaques.

Aquilo que eu mais temia aconteceu: os Jogos Abertos do Interior realmente viraram um fantasma de si mesmo.

Responsável pela direção do evento, o Governo de São Paulo já tinha dado uma amostra da invisibilidade de suas competições. Além de descaracterizar os Jogos Regionais, que são classificatórios para os Abertos e, nesse ano, não contou com sedes únicas, as disputas sequer foram divulgadas em canais oficiais.

Diante de um retrospecto assim, realmente era preciso uma boa dose de otimismo para imaginar que seria diferente agora, com os Jogos Abertos do Interior.

A situação é ainda mais emblemática porque a competição retorna após dois anos de inatividade. A última edição foi realizada em 2019, na cidade de Marília. Em 2020 e 2021 a pandemia de covid-19 impediu a realização. Ou seja, o que deveria ser uma festa que celebrasse o retorno da tradicional disputa, se tornou lamentação e desprezo.

O evento está perdendo a capacidade imaginística, como salienta os estudos de Vilém Flusser. Sem isso, os torcedores são incapazes de “imaginar” a competição – o que é um passo rumo ao desaparecimento.

Ao longo dos últimos três anos, mergulhei na história dos Jogos Abertos do Interior e de seu fundador, Horácio Baby Barioni. Tentei montar o quebra-cabeça para compreender o contexto e o que estava em jogo na criação e consolidação do evento.  Ficou claro que falta uma compreensão exata do que representa os Abertos para o esporte nacional e, claro, regional.

Sim, é uma competição esportiva que precisa ter campeões e medalhas, mas não é só isso. É festa, esporte, cultura e turismo em um mesmo pacote. Diante disso, proponho cinco sugestões para impulsionar a divulgação dos Jogos Abertos, desfazer a invisibilidade e recolocar a disputa em lugar de destaque no cenário esportivo.

1 – Trabalho multidisciplinar

A primeira ideia é justamente enxergar os Jogos Abertos como um evento de mobilização do estado e não apenas como uma competição esportiva. Ainda que a Secretaria de Esportes deva manter a liderança do projeto, enxergo como fundamental o apoio e trabalho de outras áreas, como meio ambiente, finanças, cultura e turismo. Uma força-tarefa ajudaria a enxergar mais possibilidades.

2 – Comunicação desvinculada da cidade

Nos últimos anos, a comunicação oficial dos Abertos ficou a cargo da própria cidade. Isso é importante, claro, mas cria discrepâncias. Como nesse ano, em que o site oficial só tem notícia dos atletas de São Sebastião. Seria importante criar um canal de comunicação desvinculado da sede, possibilitando a utilização de novos recursos midiáticos, como streaming, podcasts e storytelling próprio.

3 – Resgate da memória e das histórias

Essa é a 84ª edição dos Jogos Abertos do Interior. São quase 90 anos desde sua criação. É uma história que merece ser lembrada e recontada. Os grandes personagens, atletas e feitos têm que ser lembrados. Um exemplo? Uma das filhas de Baby Barioni, Edna Barioni, está viva e na ativa como advogada em São Paulo. O resgate da memória é fundamental dentro de uma comunicação esportiva.

4 – Ações com ídolos do passado e do presente

Da mesma forma que é preciso olhar para o passado, é necessário criar vínculos com o presente. Todos os anos grandes nomes do esporte nacional participam dos Jogos Abertos do Interior. São atletas que poderiam contribuir não apenas na parte esportiva, como também na parte social. Por que não estabelecer ações em conjunto com suas cidades para visitar escolas, ONGs, entre outros? É uma forma interessante de estabelecer contato com o público local.

5 – Iniciativas intercidades

Da mesma forma que é inadmissível que não haja parcerias entre cidades antes, durante e depois dos Jogos Abertos do Interior. Reconheço que concentrar grande parte da disputa em uma sede é uma forma eficiente de aproximação, mas isso não significa que precisa fazer tudo sozinho. Um grupo intercidades pode, por exemplo, explorar possibilidades para além da competição esportiva, como parcerias ambientais, culturais e sociais.

Passou da hora do Governo de São Paulo, mas também das entidades esportivas paulistas e as próprias cidades, pensarem – e desenvolverem – ações que resgatem a essência dos Jogos Abertos do Interior. Caso contrário, a cada ano que passa, o legado de Baby Barioni vai diminuir até se tornar uma memória da grandiosidade que um dia já teve.

* Gustavo Longo é jornalista especializado em cobertura esportiva e Mestre em Ciências da Comunicação na ECA/USP